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[Entrevista] Yoshio Kawakami fala sobre a crise energética no Brasil e Gestão de Negócios

Há mais de 40 anos no ramo corporativo, Yoshio Kawakami é um dos empreendedores mais conceituados do mercado, que ele conhece muito bem graças aos seus 12 anos como presidente da Volvo Construction Equipment Latin America. Kawakami também é consultor em Gestão Empresarial e investidor em Educação Inovadora.

Formado em Engenharia Industrial e Pós-graduado em Marketing, Yoshio Kawakami tem experiência para ajudar empreendedores a lidarem com a crise e todos os reflexos na indústria brasileira, entre outras questões que foram abordadas nesta entrevista exclusiva que ele nos concedeu. Confira!

A crise energética e seus efeitos na indústria

Indústria Hoje. A crise energética tem levado indústrias a instalarem fábricas no exterior, pois o alto preço da eletricidade impulsionou a preferência pela venda da própria energia, diminuindo o ritmo e até provocando o fechamento de linhas de montagem. Diante desse cenário no país, como empresários podem se preparar para uma eventual piora ou para novas crises?

Yoshio Kawakami. O mais importante é que os empresários e os executivos entendam o momento no ciclo dos negócios. É um fato que o negócio tem ciclos, ou seja, bons momentos se alternam com momentos mais difíceis, e a percepção profissional aguçada deve alertar para a necessidade de um constante preparo. Muita gente sabia que a produção de energia elétrica estava no limite, e quando o suprimento estava sendo realizado com grande sacrifício, através de fontes térmicas, já poderiam ter pensado em algumas alternativas. Ao perceber uma forte contenção artificial dos preços de combustíveis, também se poderia imaginar o refluxo no momento seguinte. Já na crise, resta cuidar dos custos em geral e buscar ganhos de produtividade, para compensar os incrementos de custos.

IH. Quais ações os empreendedores devem adotar para evitar os maiores efeitos da crise energética na indústria e quais são os erros mais comuns de empresas que acabam cortando a produção e passam por aperto nesse tipo de situação?

YK. A constante busca de eficiência e produtividade é a obrigação maior de quem administra os recursos de produção nas empresas. Muitas indústrias deixaram de atualizar a tecnologia de suas fábricas quando os custos foram represados artificialmente por interesses políticos. A leitura correta teria levado a investimentos básicos, como a substituição dos motores elétricos por unidades mais modernas de baixo consumo energético que amenizariam os impactos atuais.

IH. Como as empresas podem superar a perda de competitividade e qual é o papel do câmbio e da mão-de-obra nesse desafio encarado durante o período de crise?

YK. A tendência universal dos negócios é que os preços dos produtos tendem a cair enquanto os preços das “commodities” nem sempre seguem a mesma tendência. O custo da mão-de-obra também tende a subir com o crescimento econômico e com desenvolvimento do país, mas podendo ser compensado pelos ganhos de produtividade. A flutuação da moeda depende de inúmeros fatores e nem sempre é previsível. Ao manter um constante esforço de exportação, a empresa pode criar um “hedge” (proteção à variação cambial) natural. Mas é comum desistir da exportação quando o câmbio é menos favorável e perder a competência necessária n um momento como este. Tomar decisões observando o longo prazo pode ser uma forma de assegurar a alternativa da exportação para quando for necessário.

IH. Enquanto você era presidente da Volvo, a empresa tinha mais de 1 mil funcionários. Quais medidas de liderança os empresários podem adotar para que tenham o mesmo sucesso que você em suas empresas, ao lidarem com uma quantidade grande de funcionários?

YK. Este número representou a composição dos funcionários da fábrica, em sua maioria e das demais áreas na época. O sucesso da empresa é feito pelos esforços de muitas pessoas na gestão da organização. O mais importante é que os líderes percebam a sua responsabilidade na manutenção do trabalho para com todos os funcionários e seus dependentes. A relação mais próxima do funcionário com o seu chefe imediato é a mais importante em qualquer função.

 IH. Só em 2011, quando você atuava como presidente na Volvo, a empresa teve um faturamento de US$ 716 milhões. Ao tomar decisões financeiras, quais precisam ser as prioridades de empreendedores?

YK. Costumo alertar às pessoas que as decisões ótimas para o curto prazo tendem a ser péssimas para o longo prazo. Assim, as decisões financeiras devem levar em consideração não apenas o resultado de curto prazo, mas as perspectivas no longo prazo. Evidentemente, esse preparo deve ser feito enquanto o mercado é favorável, para se proteger quando os ventos são desfavoráveis. A busca do crescimento é a missão do executivo, mesmo em tempos difíceis.

IH. Durante a sua presidência na Volvo, houve mais de 100 modelos de máquinas para a construção no mercado brasileiro. Que tipos de precauções os responsáveis pela compra e manutenção de equipamentos devem ter para que o uso de máquinas seja o mais eficaz possível no atual cenário brasileiro?

YK. A melhor gestão desses ativos produtivos é feita com base em resultados econômicos reais. O foco deve ser no retorno que cada equipamento proporciona durante a sua vida útil ou durante o período de propriedade. O conhecimento necessário é da medição consistente dos custos operacionais e da produtividade. Mesmo num cenário como o atual, buscar apenas o custo de aquisição como parâmetro de escolha pode ser um “tiro no pé” ao longo do tempo. A eficiência é sempre o fator mais importante em qualquer ativo de produção.

IH. Antes de assumir a VCE, você foi presidente da CUMMINS, no Japão. Como você encarou os desafios de presidir companhias em países diferentes e quais as maiores preocupações relacionadas à adaptação de profissionais que costumavam trabalhar em lugares com culturas de trabalho bem distintas?

YK. O Japão é um desafio à parte, pois em muitos negócios é um mercado bastante fechado para empresas do exterior. Essas barreiras nem sempre são tarifarias ou regulamentares, mas culturais e históricas. No aspecto cultural, pode-se mencionar, por exemplo, os alimentos industrializados, que indicam no seu rótulo que “todos os ingredientes deste produto foram produzidos no Japão”, proporcionando a impressão de que isso faz com que a segurança alimentar seja superior. Com relação ao mercado de motores diesel (negócio principal da CUMMINS), as relações de cliente-fornecedor são históricas e constituem um obstáculo sério para a penetração de marcas estrangeiras. Esses aspectos culturais do negócio precisam ser compreendidos e contornados numa estratégia de longo prazo.

IH. Quais são as suas principais recomendações para empresários que decidem se aposentar, mas que ainda desejam atuar com a indústria de alguma forma?

YK. O processo de aposentadoria é, na realidade, um processo de substituição de uma atividade corporativa ou empresarial para uma nova atividade profissional. Nos dias de hoje, é difícil encontrar pessoas que, aos 60 anos, estejam resignadas a “ir para a sombra” da sociedade. Muitos possuem um vasto conhecimento, que pode ser útil para outras empresas e pessoas. Como tudo na vida, é importante uma boa preparação, considerando-se o network como principal ferramenta para essa transição. Alguns anos são necessários para verificar as ideias, desenvolver a sua estratégia pessoal e reunir os recursos necessários.

IH. Como empresas devem investir em produtividade e eficiência na hora de lidar com novos talentos no mundo corporativo, principalmente quando o país se encontra numa situação de crise?

YK. O ambiente de crise é favorável à objetividade. Muitos conseguem desenvolver a sua produtividade e a sua eficiência na medida em que as diferenças entre as alternativas se tornam mais evidentes num momento de crise. A crise é implacável em segregar as boas ideias das ideias medíocres, que, num cenário favorável, ainda poderiam propiciar resultados “aceitáveis”. A crise facilita aos novos talentos a oportunidade de visualizarem essas diferenças com maior facilidade para se dedicarem às alternativas válidas.

IH. Que dicas você dá para empresários que desejam pensar globalmente e atuar localmente na prática e quais são os desafios futuros para quem quer se preparar para uma perspectiva de mercado baseada na situação mundial?

YK. Pensar globalmente requer conhecer e acompanhar as tendências e as mudanças globais. A capacidade de abstração dos executivos e dos empresários é muito importante para imaginar o impacto das mudanças globais nos negócios locais. É o constante aprimoramento combinado com a experiência vivida que permite uma visão capaz de antecipar as mudanças locais. Manter sempre os olhos voltados para um futuro mais distante pode ser uma forma interessante de treinar-se para perceber o futuro mais próximo. Quem não estiver estudando e imaginando 2030, pode estar vivendo um risco sem percebê-lo.

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