São Paulo – Dois encargos setoriais poderão elevar a conta de luz da indústria em até 53% a partir do mês que vem e provocar protestos na Justiça.
Além do custo da energia, cada empresa – localizada no Sudeste – terá de arcar com mais R$ 79 por megawatt-hora (MWh) para subsidiar programas sociais, pagar despesas do setor e custear a operação das termoelétricas.
Essas usinas estão funcionando ininterruptamente para poupar a pouca água que restou nos reservatórios por causa da seca no Sudeste, Centro-Oeste e Nordeste.
Representantes do setor industrial ainda tentam reverter a conta com a entrega de propostas à Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).
Mas, por ora, esse é o custo extra que as empresas terão de pagar a partir de março – caminho oposto ao que setor reivindicava desde 2012 para devolver a competitividade à indústria.
Naquele ano, vários empresários pediram à presidente Dilma Rousseff medidas para baratear a conta de luz e evitar que unidades fechassem as portas.
Com a MP 579, lançada no último trimestre de 2012, a tarifa de energia caiu, em média, 20% no País. Mas, dois anos depois, os valores já voltaram aos patamares de antes, seja por causa da seca que atinge o País ou pela forma atropelada com que o processo de renovação das concessões foi feito, deixando várias distribuidoras sem contratos para atender seus consumidores e provocando um rombo bilionário no setor.
‘Um baque’
Hoje, segundo dados da comercializadora de energia Compass, uma empresa que consome 30 MW e tem um custo de R$ 150 o MWh passará a pagar R$ 229 – ou seja, um aumento de 53%.
Ao final de um ano, a empresa terá pago a mais R$ 20,8 milhões de energia elétrica. “Para o setor industrial, que está com a margem comprimida, ter esse aumento de uma forma inesperada será um baque grande no caixa”, afirma o sócio da Compass, Marcelo Parodi.
Segundo ele, muitas empresas ainda não se deram conta do aumento e podem levar um susto quando receberem a fatura em março.
“Com esses valores o governo pode quebrar muitas empresas, pois vai acabar com o lucro operacional delas”, afirma o diretor-presidente da Associação Nacional dos Consumidores de Energia (Anace), Carlos Faria.
Em 2014, a indústria nacional teve um dos piores resultados da história: caiu 3,2%, segundo o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi).
Para este ano, apesar de a alta do dólar dar um pouco mais de fôlego às empresas, as perspectivas não são boas, seja pelo mercado externo ainda fraco ou pelo consumo interno em queda.
O custo extra da energia elétrica será mais um ingrediente amargo nesse cenário negativo.
“Nesse ritmo, vamos acabar com a indústria nacional e com o País. Aí vai sobrar bastante energia para ser consumida”, reclama o executivo. A previsão anterior da Anace era de um aumento médio de 40% na conta de energia.
Hoje esse cálculo já supera os 50%. Faria afirma que a associação estuda questionar na Justiça a cobrança do Encargo de Serviço do Sistema (ESS), que tem provocado um subsídio cruzado entre o mercado livre e o mercado cativo.
Os valores do ESS são “decorrentes da manutenção da confiabilidade e da estabilidade do sistema”. Todo custo da geração térmica que superar o valor do mercado à vista (PLD), que está em R$ 388 o MWh, compõe o encargo.
No ano passado, como o PLD estava em R$ 822 o MWh, o valor transferido para a sociedade era menor. Neste ano, a Aneel reduziu o preço para menos da metade e, portanto, o encargo explodiu e chegou a R$ 20 por MWh, segundo a Compass.
Universalização
O efeito mais forte, entretanto, virá da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE), que banca a universalização da energia elétrica no Brasil, a energia do baixa renda e o custo das térmicas do Norte do País.
No ano passado, o Tesouro aportou recursos na conta para evitar o aumento da conta de luz. Neste ano, com o aperto fiscal iniciado pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, todo o valor será repassado para os consumidores.
O orçamento – colocado em audiência pública pela Aneel e encerrado na sexta-feira para o recebimento de contribuições – é de R$ 25 bilhões.
Tirando a receita que entra nessa conta, o valor que o consumidor terá de pagar é de R$ 21 bilhões. No Sudeste, cada consumidor terá de pagar R$ 59 por MWh consumido.
Segundo o presidente da Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), Paulo Pedrosa, o aumento dos custos piora a relação entre consumidores de baixa tensão (residencial) e o industrial.
Hoje a energia para as empresas é 20% mais barata comparada à baixa tensão. Na Dinamarca, diz Pedrosa, é 70% mais barata; Estados Unidos, 44%; e Reino Unido, 39%.
“A grande indústria agora subsidia o pequeno consumidor. E isso é muito ruim para a competitividade do setor”, diz Pedrosa. Normalmente, as empresas usam mais energia e menos fio e os residenciais, mais fio e menos energia, o que justificaria pagar menos na conta de luz.
Mas, segundo dados da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan), hoje o Brasil tem o sexto maior custo de energia elétrica entre 27 países, como China, Estados Unidos, Alemanha, México, Chile, Uruguai e Paraguai. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.