Enquanto os consumidores brasileiros reclamam da alta do dólar, executivos de indústrias multinacionais têm um motivo para comemorar a desvalorização do real na comparação com a moeda norte-americana. Desde 2014, o valor gasto por essas empresas com o salário dos funcionários brasileiros teve queda de aproximadamente 33,7%. Com isso, o salário dos trabalhadores do setor produtivo na região passou a ser 81,3% menor do que os vencimentos de um operário dos Estados Unidos. A um ano, era 71,2% inferior.
Segundo a PED (Pesquisa de Emprego e Desemprego), feita pela Fundação Seade (Sistema Estadual de Análise de Dados) e pelo Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), o salário médio por hora do industriário do Grande ABC é de R$ 15,04. Na conversão para o dólar (cotado a R$ 3,80), o valor fica em US$ 3,95. De acordo com o BLS (Escritório de Estatísticas do Trabalho, na sigla em inglês), nos Estados Unidos a remuneração horária para os funcionários do setor em outubro era de US$ 21,18. No mesmo mês do ano passado, era US$ 20,72, enquanto o dólar custava R$ 2,52.
Apesar da diferença ser gritante, o professor Marcos Antônio de Andrade, da Universidade Mackenzie, salienta que, para mensurar com precisão os custos do empresariado com a mão de obra brasileira, é preciso multiplicar o salário por 2,2 – o equivalente ao peso dos encargos trabalhistas nacionais. Assim, o rendimento por hora dos industriários do Grande ABC sobe para US$ 8,69. Mesmo assim, a quantia é 58,9% inferior à dos Estados Unidos. “Além disso, também é preciso levar em conta o custo de vida de cada país”, pondera.
Andrade avalia que a redução dos custos com mão de obra no Brasil tende a melhorar a competitividade da indústria do País. “O Brasil está ficando barato. Então, uma multinacional resolve colocar uma planta por aqui devido aos baixos custos”, comenta.
Já o economista Ricardo Balistiero, coordenador do curso de Administração do Instituto Mauá de Tecnologia, tem visão diferente. Na opinião dele, a depreciação do real por si só não tem potencial para aumentar o volume de investimentos estrangeiros no País. “Para que o empresário tome uma decisão como essa, precisa levar em conta outras variáveis, como a carga tributária, burocracia, marcos regulatórios e até indicadores sociais, como a violência.”
Não são só os Estados Unidos que estão na frente do Brasil no ranking de salários pagos pela indústria. No Canadá, cada empregado do setor que não ocupe cargos de chefia recebe, em média, US$ 15,52, conforme o Statistics Canada, órgão oficial de estatísticas do governo canadense.
Na Ásia, quatro localidades estão na frente do Grande ABC, segundo a IndustriALL Global Union: Yokohama (Japão), Seul (Coreia do Sul), Singapura e Taipei (Taiwan). Os salários mais baixos pagos pela indústria daquele continente são para os trabalhadores de Yangon, em Mianmar: US$ 35 por hora. “Na Ásia ocorre uma precarização muito grande da mão de obra. Entretanto, o custo de vida lá é bem mais baixo. No Camboja, por exemplo, daria para se viver bem com um salário-mínimo brasileiro”, destaca Balistiero.
INFLAÇÃO – Além da redução proporcional dos salários dos brasileiros em relação aos estrangeiros, um fator responsável por diminuir o poder de compra dos trabalhadores no mercado interno é a inflação. A última PED, apresentada na semana passada em evento no Consórcio Intermunicipal do Grande ABC mostra que, entre setembro de 2014 e o mesmo mês deste ano, o rendimento médio real mensal dos empregados de todos os setores na região teve queda de 11,4%, passando de R$ 2.276 para R$ 2.017. Na comparação com agosto, a retração foi de 2,3%. A pesquisa não disponibilizou os dados referentes à indústria, pois a amostra não comportou a desagregação para essa categoria específica.
Fonte: Diário do Grande ABC