Tenho escrito bastante sobre a Quarta Revolução Industrial e o fenômeno das empresas exponenciais. Isto tem rendido muitos convites para debater o assunto com executivos, que, claro, questionam diversos aspectos. São debates instigantes e que permitem reforçar meus conceitos. Neste artigo vou colocar alguns destes questionamentos e debater com vocês.
Duas das questões principais são se realmente as organizações exponenciais (ExO – Exponential Organizations) existem mesmo e, em caso afirmativo, se não são apenas um fenômeno passageiro, um hype que vai desaparecer em pouco tempo. Os convido a ler e reler o livro “Exponential Organizations: Why new organizations are ten times better, faster, and cheaper than yours (and what to do about it) ” para um aprofundamento maior do assunto.
Estes questionamentos são normais quando nos deparamos com uma quebra de paradigmas. Um paradigma é um modelo mental e durante décadas fomos doutrinados a pensar de determinada forma. Um olhar diverso, causa, no mínimo, desconforto. Uma pequena e engraçada animação disponível no Youtube (Como nascem os Paradigmas – Grupo dos Macacos) mostra claramente porque muitas vezes pensamos naturalmente em empresas baseadas no modelo hierárquico, fazemos projeções lineares (mesmo em um mundo exponencial) e relutamos em adotar novas tecnologias. Simplesmente, nos acostumamos a estes modelos e não os questionamos.
Um olhar neutro sobre o contexto de negócios mostra nitidamente que as mudanças já estão acontecendo. A rápida e exponencial (r)evolução tecnológica está transformando industrias e criando concorrências inesperadas. À medida que a Internet e a tecnologia se disseminam pela sociedade, mudam dramaticamente o contexto estratégico. Alteram a estrutura da competição, a maneira de fazer negócios e eliminam fronteiras entre setores de indústria antes distintos. Desagregam cadeias de valor estabelecidas e criam outras, movidas por novos entrantes que jogam outro jogo. Estas escalam mais rapidamente e a menor custo que as empresas existentes, criando um cenário competitivo inteiramente desconhecido.
Já começamos a ver sinais de mudanças radicais no conceito de emprego e provavelmente a criação de inúmeras novas profissões. Talvez daqui a 25 anos ninguém mais comemore 25 anos de atuação na mesma empresa. E muito provavelmente não permanecerá 25 anos na mesma profissão.
Vamos mostrar aqui uma comparação de como os cenários estão em transformação: se compararmos Detroit, cidade americana sede das principais indústrias automotivas americanas, e, portanto, emblemática da sociedade industrial, de 1990, com o Silicon Valley em 2014, veremos diferenças significativas. Em 1990 as três maiores companhias automotivas tinham, combinadas, uma capitalização de mercado de 36 bilhões de dólares, receitas de 250 bilhões de dólares e possuíam 1,2 milhão de funcionários. Em 2014, as três maiores empresas do Silicon Valley tinham um valor de mercado de 1,09 trilhão de dólares (consideravelmente maior!), geravam quase a mesma receita (247 bilhões de dólares), mas tinham cerca de 10 vezes menos funcionários, em torno de 137.000.
Mudança de paradigma. Para entender uma organização exponencial (ExO) vale a pena ler o livro “How Google Works”, de Eric Schmidt, que aborda diversos tópicos que desafiam os modelos usados na imensa maioria das empresas pré-Internet, como cultura, conquista de talentos, processo de tomada de decisões, de inovação e disrupção, e assim por diante.
O fato é que vivemos em um mundo de constantes disrupções. A mobilidade e os apps, estão mudando nossos hábitos. São eles que permitem transformar o smartphone e o tablet em qualquer objeto ou ferramenta que simplifique o nosso dia a dia. Com apps podemos identificar restaurantes e lojas, pesquisar preços para tomar melhores decisões de compra, nos conectarmos às mídias sociais, enfim, torná-lo parte integrante da nossa vida diária. Uma mudança rápida, pois o iPhone surgiu apenas em 2007!
Mas, temos que ir além dos apps. Estamos às voltas com inúmeras inovações tecnológicas que não podem, em absoluto, serem ignoradas. Assim discutimos diversas tecnologias como Internet das Coisas, drones, impressoras 3D, sistemas de Machine Learning e seus impactos na sociedade. O fato é que as tecnologias digitais estão transformando o mundo à nossa volta, as cidades que habitamos, a maneira como estudamos, as formas das nossas comunicações e as economias em que vivemos.
Criamos a chamada “shared economy”. E os novos modelos assustam. Um indicativo do quanto assustam é a contagem e agressividade de seus inimigos. Vejamos o Uber e as constantes brigas com os taxistas e as tentativas políticas de travar sua operação. As operadoras de telefonia tentado apagar o WhatsApp e o Netflix sendo alvejado pelas empresas de TV pagas. Em valor de mercado, o Uber já soma 62 bilhões de dólares, mais que a veterana GM, símbolo da indústria automotiva. O Netflix está avaliado em 45 bilhões de dólares.
Se transformar em uma ExO é uma necessidade de sobrevivência para as empresas atuais. Não é, em absoluto uma tarefa simples, mas é essencial. Já vemos muitas empresas caminhado nesta direção, em ritmos diferentes, claro, mas tentando se transformar. Sugiro dar uma olhada no “quociente exponencial” das empresas que contam da lista Fortune 100, ou sejam, as 100 maiores empresas do mundo. Algumas terão grandes desafios para sobreviver…
Quebrar paradigmas significa repensar conceitos arraigados. Olhemos, por exemplo, o conceito de “Too big to fail” que envolve o sistema financeiro. Alguns bancos são tão grandes que sua falência, segundo a teoria, provocaria crises econômicas significativas.
Existe um debate que provoca fissuras neste conceito, com o “too big to fail, too big to exist”, que já vemos acontecer nos EUA. Tem um artigo interessante (“Top Financial Regulator Might Actually Break Up ‘Too Big To Fail’ Banks”) que coloca o assunto em debate. E note que o tema, até pouco tempo atrás, era inquestionável. Se estas ideias forem à frente, abrirão espaço para disrupções, dando maior impulso às Fintechs, ampliando rupturas no tradicional setor financeiro.
Muitos conceitos que criaram modelos de negócio de sucesso estão sendo colocados em cheque. Muitas empresas foram criadas sob o paradigma da escassez. Escassez significava valor. Hoje, vemos novas empresas transformando escassez em abundância e criando modelos de negócio diferentes. Um exemplo simplista são os aplicativos de táxis como EasyTaxi e o 99 Taxi. Antes conseguir um táxi dependia de você ter sorte. Era um produto escasso. Embora o número deles não tenha variado, os apps o tornaram abundantes, pois com informação eu sei quantos estão perto de mim. O que mudou, o que transformou escassez em abundância? Informação. Esta passa a ser a nova moeda de valor.
Aliás, este tema é debatido no livro “The Zero Marginal Cost Society: The Internet of Things, the Collaborative Commons, and the Eclipse of Capitalism”. É um debate sobre novos modelos econômicos com impacto direto na maneira das empresas realizarem negócios.
Que todo este debate nos mostra? Que a transformação digital vai atingir de forma disruptiva todos os setores, em maior ou menor grau. E é apenas o ponto de partida, a base, que vai nos permitir construir novos e inovadores negócios.
Isso vai acontecer muito mais rápido que pensamos. Seu negócio estabelecido há dezenas de anos não garantirá sua sobrevivência nos próximos dez anos. Os executivos das empresas, sejam CEOs, CMOs, CFOs e sim, os CIOs, devem olhar com atenção estes movimentos de mudança estruturais e desenhar as estratégias de reinvenção de seus negócios.
O papel dos CIOs deverá mudar significativamente nos próximos anos, assumindo a liderança da jornada de transformação digital, sob o risco de perder relevância, se não o fizer! E claro, a organização da TI deverá mudar. Uma organização digital deve responder com rapidez às mudanças. Uma estrutura hierarquizada e rígida não sobreviverá ao dinamismo da digitalização. As mudanças demandam velocidades que os atuais modelos organizacionais não conseguem atender.
Esta reinvenção passa pela mudança na maneira de pensar. Não mais linear, mas de forma exponencial. Em tempos exponenciais, ficar parado é matar a empresa. A disrupção vai fazer parte do dia a dia e pensar de forma diferente (como seria a empresa se eu começasse do zero hoje?), passará a ser o cerne das discussões estratégicas.
Estamos no início da curva de transformações. Algumas tecnologias estão se acelerando de forma exponencial. Em breve a convergência exponencial de diversas delas, criará rupturas em modelos de negócio estabelecidos. Imaginem impressoras 3D, Machine Learning, Cloud Computing e a disseminação da Internet das Coisas, juntos, permitindo criar modelos de negócio que simplesmente destruam total ou parcialmente o valor de setores sólidos como o de logística. Parece impossível pensar assim, e é, quando pensamos linearmente… mas tente imaginar um software “inteligente” (um assistente pessoal), entendendo sua descrição de um produto (pela sua descrição oral, desenhos e fotos), interagindo com você para desenhar as especificações detalhadas, que serão então enviadas a uma impressora 3D capaz de produzir tal produto que será entregue na sua casa através de uma empresa de logística disruptiva como Shyp. Sim, a tradicional logística pode ser um setor a sofrer disrupções e sugiro ler o artigo publicado recentemente pela Fast Company, “How Shyp Is Shaking Up Shipping”.
Como o crescimento é exponencial, a adição de mais alguns bilhões de pessoas conectadas à Internet nos próximos anos aumentará ainda mais o número de ideias e propostas de negócios inovadores. Tudo isso chegando cada vez mais rápido…um tsunami, ainda em alto mar, não perceptível, mas que ao tocar o solo causará uma devastação. Então, como nos preparar para este tsunami, uma vez que o terremoto causador dele já foi detectado?
Fonte: Computer World