São Paulo – O sonho de Alonso Pereira, hoje com 24 anos, era trabalhar na indústria em São Paulo. Há um ano e meio, ele deixou Araripina, em Pernambuco, e conseguiu emprego na Fluid Feeder, fabricante de equipamentos para tratamento de água na zona leste da capital. Foi indicado por um primo que também trabalhava na empresa.
Há dois meses, o sonho foi desfeito. Pereira foi demitido junto com seis primos e outros funcionários. “A empresa alegou queda da demanda”, diz o ex-auxiliar de produção. “Mas ainda há quatro primos lá representando a família”, brinca.
Em vez de procurar outro emprego, Pereira decidiu voltar para o Nordeste. “A empresa disse que, se as coisas melhorarem, volta a nos chamar em agosto. Mas, se eu me der bem no ‘Norte’, vou ficar por lá”, diz.
O medo do desemprego começa a bater na porta dos trabalhadores da indústria, que até agora tentava segurar a mão de obra na expectativa de uma melhora no quadro econômico.
Com um número negativo de 28,5 mil postos no mês passado, o setor levou o País a registrar o pior maio em saldo de empregos formais em 22 anos, com 58,8 mil vagas, segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), do Ministério do Trabalho.
No período de um ano, só a indústria de São Paulo demitiu quase 100 mil pessoas na região metropolitana – entre elas Pereira e seus primos -, de acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do IBGE.
O sinal amarelo levou as centrais sindicais CUT e Força Sindical e segmentos da indústria, como montadoras e autopeças, a retomarem a discussão da criação de um sistema nacional de proteção ao emprego, com a flexibilização das regras trabalhistas. A proposta já foi discutida em 2012 e em abril passado, mas está parada no governo.
O pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas (Ibre/FGV), Fernando de Holanda Barbosa Filho, ressalta que a produção industrial não cresce há dois anos, período em que o emprego ficou estável pois os empresários esperavam a melhora desse quadro. “Agora, algumas empresas não acham mais que amanhã será melhor e passam a demitir.”
Segundo o economista da LCA Consultores, Fábio Romão, além do fraco desempenho da economia, “a confiança não anda das melhores por parte dos empresários”. Ele lembra que, à exceção da indústria química e farmacêutica, os outros 11 segmentos da indústria tiveram saldo negativo de empregos em maio.
O ramo de mecânica foi que mais cortou (6,6 mil postos), seguido pelo de material de transporte, onde estão montadoras e autopeças, com 5,5 mil demissões, segundo o Caged.
No período de janeiro a maio, o saldo de contratações e demissões na indústria é positivo em 72,2 mil vagas. Nos últimos 11 anos, a geração de vagas sempre foi maior neste período do ano, com exceção de 2009, quando ocorreu a crise internacional e o saldo ficou negativo em 144,1 mil vagas.
Somando todos os setores econômicos, o resultado em 2014 é positivo em 543,2 mil postos. O desempenho é puxado por comércio e serviços que começam a perder fôlego.
Limite. Romão acredita que o saldo de vagas formais na indústria seguirá negativo até o fim do ano, após 15 anos seguidos de resultados positivos.
Paulo Francini, diretor da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), diz que os custos de demissão são altos e normalmente as empresas não promovem cortes se acreditam que vai precisar de pessoal no futuro. “Só que a espera tem limite”, diz ele, que não vê sinais de melhora na economia.
Francini afirma que o Brasil passa por “um dos processos de desindustrialização mais severos do mundo”, o que tem levado às demissões. Um dos motivos é a alta das importações.
Depois de cortar 12,5 mil postos em maio, a indústria paulista tem saldo positivo de apenas 16 mil vagas neste ano, o mais baixo resultado desde 2009, quando foram fechados 34,5 mil postos. Ele calcula para o ano todo um saldo negativo de 40 mil a 45 mil vagas.
Clemente Ganz Lúcio, diretor técnico do Dieese, ressalta que cada posto na indústria equivale a outros cinco na área de serviços à indústria. Ele, contudo, aposta em melhora da produção, principalmente no setor automotivo, após medidas como o acordo com a Argentina. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Cleide Silva e Anna Carolina Papp, do Estadão Conteúdo