Rio – O alto custo com demissões e a escassez de mão-de-obra qualificada explicam por que a indústria não tem conseguido enxugar os gastos com a folha de pagamento em ritmo satisfatório, apesar de meses de cortes no número de empregados.
Cálculos da Tendências Consultoria Integrada, obtidos com exclusividade pelo Broadcast, serviço de notícias em tempo real da Agência Estado, mostram que a folha de pagamento real por hora trabalhada mantém a tendência de perda de fôlego, com alta de 2,9% nos 12 meses encerrados em agosto, contra um aumento de 4,9% no mesmo mês do ano anterior.
Entretanto, a taxa de crescimento ainda é muito superior à da produtividade, que aumentou apenas 1,2% nos 12 meses encerrados em agosto deste ano.
O economista Rafael Bacciotti, responsável pelo levantamento com base nos números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), explica que, embora o poder de barganha dos trabalhadores tenha diminuído, o setor ainda encontra disponibilidade reduzida de mão de obra qualificada no mercado, o que pressiona os custos da força de trabalho.
“A gente tem observado escassez de oferta de mão de obra. A população economicamente ativa vem diminuindo ao longo dos últimos trimestres, e há um problema de qualificação da força de trabalho disponível”, apontou Bacciotti.
No entanto, ele diz que a desaceleração no ritmo de crescimento da folha mostra que houve uma redução no ímpeto das negociações. Os trabalhadores já não conseguem mais aumentos na mesma proporção que conseguiam antes, o poder de barganha diminuiu.
“A folha nominal também traz movimento de desaceleração nos aumentos”, lembrou Bacciotti, indicando que o crescimento menor da folha da indústria não foi causado pela inflação em alta nos últimos meses.
Cortes
Em crise, a indústria corta vagas há 35 meses consecutivos, segundo dados da Pesquisa Industrial Mensal de Emprego e Salário (Pimes) do IBGE.
No entanto, a folha de pagamento só encolheu nos últimos três meses divulgados pela pesquisa, de junho a agosto, na comparação com o mesmo mês do ano anterior. No ano, enquanto o número de empregados diminuiu 2,7%, a folha de pagamento cresceu 0,4%.
Segundo Rodrigo Lobo, economista da Coordenação de Indústria do IBGE, os gastos das empresas com as demissões ajudam a explicar o aumento das despesas apesar do enxugamento do número de funcionários ainda trabalhando.
“Faz parte da composição da folha a renda proveniente da demissão. A pessoa demitida recebe a verba rescisória, então a folha captava essa renda. Mas agora já começa a ceder “, ponderou Lobo.
A Pesquisa Mensal de Emprego (PME), também do IBGE, mostrou que a tendência de corte de postos de trabalho na indústria manteve-se em setembro.
O parque industrial das seis principais regiões metropolitanas do País demitiu 59 mil pessoas em apenas um mês. No período de um ano, as dispensas já somam 238 mil vagas. “No ano, a industria é a atividade que ostenta a maior perda de pessoal ocupado”, confirmou Adriana Beringuy, técnica da Coordenação de Trabalho e Rendimento do IBGE.
O economista Leandro Horie, do Dieese, lembrou que a piora no mercado de trabalho da indústria reflete quedas na produção e no PIB industriais nos últimos anos.
“Desde 2009, a indústria, tanto em termos de emprego quanto de produção, oscila dentro de uma média. Quedas são seguidas de recuperação, mas ela volta ao patamar de antes da crise internacional e não sai disso”, notou.
A essa situação, vista mais como conjuntural, soma-se uma crise estrutural, relacionada à falta de investimentos em inovação e atraso tecnológico, câmbio desfavorável, falta de competitividade e vazamento de demanda para importados. “O custo da mão-de-obra é o menor dos problemas”, defende Horie.
As informações são do jornal O Estado de S. Paulo.
Daniela Amorim e Vinicius Neder, do Estadão Conteúdo