A comercialização de soja no mercado brasileiro deve ser lenta nas primeiras semanas do ano novo. O elevado porcentual da safra 2015/16 vendido antecipadamente e a preocupação quanto ao desenvolvimento das lavouras em algumas áreas por causa da irregularidade das chuvas farão produtores ofertar o restante pouco a pouco. As oportunidades de negócios virão dos movimentos do dólar e do peso das vendas dos Estados Unidos e da Argentina sobre os futuros na Bolsa de Chicago.
Entre os dois maiores produtores do Brasil, Mato Grosso tem 55,3% da safra 2015/16 já negociada, e Paraná, 33%, antes de a colheita começar. A consultoria AgRural estimava, antes do Natal, que 44% da produção brasileira estava vendida, superando os 26% do ano passado e os 40% da média de cinco anos.
“Devemos ter uma comercialização parecida com a da safra 2013/14, com avanço rápido antes do plantio, e um ritmo mais lento pós-colheita”, apontou a analista Natalia Orlovicin, da INTL FCStone.
Para a analista Andrea Cordeiro, da Labhoro, produtores brasileiros adiantaram as vendas de boa parte da produção e “somente venderão mais após a definição de safra”. “Com um provável atraso de safra, não se descarta a possibilidade de trocas de posição do Brasil para Argentina ou EUA nos embarques para janeiro e fevereiro”, assinalou.
Apesar das vendas mais espaçadas, representantes de tradings no Brasil apostam em aumento das exportações brasileiras em 2016. A Associação Nacional dos Exportadores de Cereais (Anec) prevê 57 milhões de toneladas, em comparação com as 52 milhões de toneladas estimadas para 2015, enquanto a Associação Brasileira das Indústrias de Óleos Vegetais (Abiove) projeta aumento de 54 milhões para 55 milhões de toneladas.
Na avaliação do CEO da Céleres, Anderson Galvão, o preço não será tão elevado em dólar. “Mas continuamos com liquidez nos embarques”, disse. “O Brasil tende a ganhar em volume e não em receita.”
Os poucos produtores que conseguiram plantar no início da temporada em condições favoráveis de umidade poderão se beneficiar de eventual pico de preços em janeiro, uma vez que o mercado interno tende a virar o ano com pouca soja nos armazéns. “O estoque de soja está bem apertado porque a exportação foi forte”, assinalou Galvão. “Diferentemente de janeiro 2015 e janeiro 2014, em 2016 teremos um volume menor no disponível neste mês.”
Contudo, mesmo quem tem soja no início de 2016 pode acabar segurando o grão por causa da incerteza sobre o clima. “Foi negociada quase 50% da safra brasileira, e esse número só não é maior por consequências climáticas do El Niño, que vem se mostrando de forma bastante agressiva em várias regiões do País”, disse o presidente da Associação dos Produtores de Soja do Brasil (Aprosoja Brasil), Almir Dalpasquale.
“O produtor não avançou muito na venda por receio de não ter como cumprir contrato se tiver problema em virtude da falta ou excesso de chuva.” Para Andrea, da Labhoro, a preocupação com o El Niño não é apenas para o período de desenvolvimento, mas também da colheita. “Há um estresse antecipado em relação às condições climáticas durante a janela de colheita”, assinalou.
Segundo Dalpasquale, da Aprosoja Brasil, a safra de soja brasileira não deve mais ultrapassar a marca de 100 milhões de toneladas, como prevê a Companhia Nacional de Abastecimento (Conab). Ele diz que, além do clima desfavorável ao plantio, o dólar forte inibiu a compra de insumos, e o crédito ficou mais restrito.
“Os problemas foram muitos. Acho bastante difícil chegarmos a esse número (100 milhões de toneladas)”, afirma. Ele citou atrasos no plantio no Rio Grande do Sul e em Mato Grosso do Sul, com excesso de umidade, e possibilidade de perdas de produtividade no Matopiba e em Mato Grosso, com precipitações abaixo do esperado.
Caso as condições fiquem mais favoráveis a partir de agora e os países da América do Sul colham safra cheia, os preços da oleaginosa podem cair dos atuais níveis. Para Natalia, da FCStone, se a safra brasileira ficar perto dos 100 milhões de toneladas e a argentina perto dos 60 milhões de t, os preços podem recuar abaixo dos US$ 8,80/bushel. “Contudo, outro fator que começa a despontar nessa época é a nova safra dos Estados Unidos, o que também pode mexer com o mercado.”
Para o economista do Itaú Unibanco Artur Manoel Passos, o cenário base é de preços em torno de US$ 8,80/bushel em 2016, mas a pressão da colheita sul-americana pode causar um recuo para níveis mais baixos. “Houve algum investimento adicional em construção de armazenagem e vários produtores estão bem capitalizados depois de boas safras. Podem segurar um pouco mais, sim, esperando, por exemplo, um momento de maior preocupação com os Estados Unidos.”
Ele citou como exemplo a janela de oportunidade em 2015, quando o plantio atrasou no Hemisfério Norte por excesso de chuvas. “O preço da soja subiu de US$ 9,20/bushel para US$ 10,60/bushel entre o fim de maio e o fim de junho por preocupações com a safra norte-americana, que não se concretizaram. Produtor pode tentar esperar essas janelas de oportunidade.”
Fonte: Globo.com