A Petrobras decidiu construir a refinaria Abreu e Lima (PE), sua obra mais cara, sem ter um projeto definido e fazendo uma “conta de padeiro” para estimar o custo inicial, disse o ex-diretor da estatal Paulo Roberto Costa, 60.
Investigado por suspeita de corrupção e envolvimento com um bilionário esquema de lavagem de dinheiro, ele recebeu a Folha na semana passada para sua primeira entrevista desde que foi libertado, após 59 dias de prisão.
Com custo inicial estimado em US$ 2,5 bilhões (R$ 5,6 bilhões), Abreu e Lima deverá custar US$ 18,5 bilhões (R$ 41,5 bilhões) quando ficar pronta, em 2015. “A Petrobras errou”, disse Costa. “Divulgou o valor de US$ 2,5 bilhões sem saber quanto a refinaria iria custar, sem um projeto.”
O ex-diretor afirmou que não houve superfaturamento nas obras, apesar dos indícios apontados pelo TCU (Tribunal de Contas da União). Réu na Justiça junto com o doleiro Alberto Youssef, Costa disse que nunca fez remessas ilegais ao exterior.
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Folha – Como o sr. conheceu Alberto Youssef?
Paulo Roberto Costa – Eu o conheci por volta de 2007. Ele assessorava o deputado José Janene [do PP, que morreu em 2010]. Eu sabia que ele tinha participação numa rede de hotéis e numa empresa de turismo. Às vezes nos encontrávamos com o deputado.
Sabia que ele era doleiro?
Soube que ele teve problemas no passado, mas nunca entrei em detalhes sobre isso. Ele me procurou em 2013 para prestar consultoria. Ele queria comprar a Ecoglobal, que estava prestes a assinar um contrato com a Petrobras.
Youssef falou: “Não entendo nada de petróleo. Queria que você analisasse esse negócio para mim”. Acertamos a consultoria em R$ 300 mil e, em maio de 2013, um ano e um mês depois de eu ter saído da Petrobras, ele me pagou com um carro, o Land Rover Evoque. Minha participação em lavagem de dinheiro e remessa para o exterior é zero.
A PF diz que o sr. ajudou a Ecoglobal a obter um contrato de R$ 444 milhões com a Petrobras e queria comprar 75% da empresa por R$ 18 milhões.
De maneira alguma. A imprensa tem uma interpretação errônea. Contrato não quer dizer lucro. Você pode conseguir um contrato de R$ 400 milhões e ter um prejuízo de R$ 50 milhões. Jamais tive contato com ninguém da Petrobras sobre a Ecoglobal.
Por que a PF achou papéis da empresa que o sr. tem no Panamá no escritório do doleiro?
Eu tinha na Costa Global contratos com uma empresa italiana e a coreana Samsung. Elas não podiam me pagar no Brasil. Criei uma empresa offshore, mas não deu tempo de abrir conta. Nenhum desses negócios foi concretizado.
A PF suspeita que uma empresa de navios que trabalha para a Petrobras pagou R$ 6,25 milhões como propina ao sr.
Essa acusação não tem sentido. Não recebi esse dinheiro. A Maersk é a maior empresa de navegação do mundo e, por volta de 1986, 1987, passou a atuar no Brasil no transporte de gasolina e gás. Ela veio por meio de um amigo, o [Wanderley] Gandra. É corretora, como a de imóveis. O broker [corretor] faz a intermediação e negocia a comissão. A empresa não tem nada a ver comigo.
Quando a obra da refinaria Abreu e Lima foi anunciada, em 2005, o custo era de US$ 2,5 bilhões, mas o preço final deve chegar a US$ 18,5 bilhões. O que explica essa diferença?
Não teve superfaturamento. Como você avalia o custo de uma refinaria? A Petrobras pegou uma refinaria no golfo do México e falou: quanto custa o preço por barril para construir uma refinaria lá? Custa US$ 15 mil, US$ 20 mil. Se fosse US$ 15 mil por barril, e Abreu e Lima produzisse 200 mil barris, a obra ficaria em US$ 3 bilhões. Essa é uma conta de padeiro. As condições aqui são muito diferentes das do golfo do México. A Petrobras errou. Divulgou o valor de US$ 2,5 bilhões sem saber quanto a refinaria iria custar, sem ter um projeto.
Que papel o sr. tinha na obra?
Eu era dono do orçamento, mas não mandava na obra. Os contratos têm de ser aprovados pela diretoria colegiada: o presidente e sete diretores. Quem levava esses documentos é o diretor da área de serviços, não a minha diretoria.
O TCU apontou vários superfaturamento na refinaria.
Vou dar um exemplo. Na terraplanagem, o TCU se baseia em dados do Dnit, que faz estradas onde circulam caminhões de 30 toneladas. Abreu e Lima tem tanques de petróleo que pesam 100 mil toneladas [mais de 3.000 vezes a mais]. Concluindo: acompanhei Abreu e Lima, afinal a refinaria viria para mim, e não houve superfaturamento. Você pode falar que o preço da obra em dólar por barril saiu mais caro. Saiu. Mas é preciso fazer refinaria porque nenhum país do mundo deve depender de refino de petróleo [no exterior].
Qual será o preço do barril em relação ao custo da obra?
É só dividir o preço da refinaria [US$ 18,5 bilhões] pela produção de 230 mil barris [dá US$ 80 mil por barril]. Não dá para comparar com o golfo do México, porque lá tem polo petroquímico, com empresas que produzem energia e água para a refinaria. Aqui a Petrobras tem de cuidar da energia, da água. Comparar Abreu e Lima e o golfo do México é como comparar laranja com banana.
O sr. sabe por que fornecedores da refinaria fizeram depósitos para empresas de Youssef? É propina, como diz a PF?
Não sei dizer.
MARIO CESAR CARVALHO da UOL